Ontem à noite, recebi uma ligação de um amigo e meliponicultor, o Luiz Medina do Rio de Janeiro-RJ, que me questionava a respeito de um comportamento que ele e sua família vinham observando com certa preocupação, rsrs.
Há alguns meses atrás eu fiz uma doação de uma colônia jovem de Jandaíra a AME-Rio (Associação dos Meliponicultores do Estado do Rio de Janeiro) e esta dita colônia atualmente encontra-se na casa (melhor dizendo, apartamento) do Luiz para que essa caixa possa ajudar (fornecendo machos diferentes) a uma outra colônia de Jandaíra que é de propriedade do Luiz e será em breve desdobrada.
Como ele não tem muito espaço, acabou colocando a colônia da AME-Rio um pouco acima da dele. Com o passar dos dias, foi observado por ele que as abelhas da AME-Rio estavam entrando na caixa dele e vice-versa.
Como todo mundo sabe laços feromoniais diferenciam abelhas de colônias diversas, assim, uma abelha de uma outra colônia dificilmente vai entrar em outra caixa pois corre o risco de ser morta por ter um "cheiro" diferente das outras abelhas, as abelhas encaram essa "invasão" de uma abelha de caixa diferente como pilhagem, ou seja, as abelhas entram na caixa errada de propósito para roubar material, cera, mel etc.
O Luiz me questionava se esse comportamente observado em suas colônias de Jandaíras eram sinônimo de pilhagem.
Para as Jandaíras, essa tese comportamental deve ser relativizada, passo a explicar o porquê:
Durante todos esses anos de manejo com as Jandaíras uma coisa eu aprendi muito rápido com elas, essas abelhas possuem um comportamento extremamente social, as colônias de Jandaíra sempre estão se ajudando mutuamente, as observações feitas pelo amigo Luiz são muito comuns nas minhas também, sempre observo essas entradas erradas em colônias vizinhas.
É muito comum as Jandaíras se comportarem desse jeito, pois devido as adversidades da caatinga, as abelhas precisam serem solidáiras umas com as outras, é muito comum empréstimo de material para construção ou mesmo mel para a manutenção de alguma colônia mais fraca.
Esse comportamente, que aparentemente parece estranho é muito interessante pois mostra o quanto as Jandaíras se parecem com o povo da região, é característica do Nordestino ser sempre solidiário com seu próximo. É costume local do sertanejo ajudar o companheiro que esteja precisando, doa um saco de farinha, um pouco de feijão, um pouco de milho ou mesmo uma criação (ovelha) para matar a fome daquele esteja em mais precisão. Muitas vezes tira até de onde não tem, mas ninguém morre de fome por falta de ajuda.
O Padre Monsenhor Humberto Brunmeng, um dos pioneiros na criação de Jandaíras aqui em Mossoró-RN, também já fazia essas mesmas observações, em alguns momentos costumava colocar as abelhas de castigo, fechava a entrada das colônias por alguns dias para impedir essas entradas erradas.
Na verdade, esse comportamente é muito peculiar dessa espécie, raramente se concretiza dessa forma em outra espécies, nas uruçus por exemplo essas entradas erradas são rapidamente coibidas, as obreiras vigias quase sempre imediatamente entram em guerra com as abelhas invasoras pois certamente o interesse das intrusas é de pilhagem e não a solidariedade.
No intuito de certificar esse comportamento, certa vez fiz uma experiência muito curiosa, coloquei uma rainha jovem e um pequeno disco de cria juntamente com alguns poucos potes de alimento em uma caixa vazia com bastante cera, o meu interesse era observar se abelhas iriam ser tentadas a pilharem a grande quantidade de cera que tinha sido deixada de propósito na caixa sem nenhuma proteção.
Para minha feliz supresa o que aconteceu foi algo surpreendente, passado alguns poucos dias eu abri a caixa e observei que algumas dezenas de obreiras de uma caixa forte vizinha tinham se deslocado para a caixa da rainha solitária e passaram a adotar aquela caixa ajudando a rainha no desenvolvimento do enxame.
A foto acima mostra a dita colônia após 20 dias depois do início da experiência.
(a cera que foi dada em excesso, parte foi transformada em potes de alimento e o resto intacta)
Isso só mostra o quanto as abelhas são inteligentes ao ponto de desenvolverem um comportamento que aparentemente é apenas observado em poucos animais, a solidariedade.
Já imaginou se todos fossem assim, que mundo melhor teríamos!
att,
Mossoró-RN, 16 de novembro de 2009.
Kalhil Pereira França
Meliponário do Sertão
Meliponário do Sertão
Sr. Kalhil fiquei muito admirado pois não fazia ideia que essa espécie de abelhas trabalhavam de modo solidário muito diferente das Meliferas.
ResponderExcluiraté outro dia...MELFONTENOVA