domingo, 19 de dezembro de 2010

Dia de muito trabalho "situando colônias"

Uma das coisas que mais dá trabalho na meliponicultura é passar um enxame do pau para caixa racional. Meus amigos, isso é um manejo desgraçado, sempre que tenho alguma abelha pra "situar" fico dias, chego a meses criando coragem pra fazer isso.

Primeiro por que toda transferência é muito traumática para as abelhas. Mesmo com todo o cuidado e com toda a experiência que nós aqui do Meliponíario possuímos não tem jeito, sempre se corre o risco de se matar muitas abelhas ou mesmo se perde alguma rainha durante essas "operações especiais", segundo por que é um trabalho cansativo, mesmo começando logo bem cedo sempre termino já bem tarde e com o ombro podre doendo.

Bem, mas como não dá pra criar de forma racional assim o jeito é enfrentar o trabalho, ter muita disposição pra gastar e paciência pra ir resolvendo os problemas que vão aparecendo durante abertura do oco.


A melhor hora pra se fazer isso é de manhã bem cedo, separe as ferramentas (cunhas, marretas, facas, garfos, serra circular etc).

A primeira coisa a se fazer é colocar uma caixa vazia no lugar e na altura que se encontrava o ninho natural pra ir acomodando as abelhas campeiras que forem chegando do mato e as abelhas que forem saindo durante as batidas iniciais no tronco, pra ajudar a aceitação uso um pouco de cera na entrada para familarizar as abelhas.

Antes de abrir propriamente dito, damos algumas batidas para irritar as abelhas, assim elas saem pra defender a morada, isso ajuda a reduzir os riscos de mortandades. Assim que saem vão defender a sua casa procurando beliscar o intruso, mas logo vão procurar o local inicial de sua casa, nessa hora vão dá de cara com a caixa racional que vão estranhar, mas vão entrar pois a Jandaíra não gosta de ficar muito tempo do lado de fora.


É nessa hora que iniciamos o trabalho pesado. O ideal seria trabalhar com o tronco na vertical, do jeito que se encontrava antes de você iniciar o manejo, mas é dificil trabalhar assim pois não existe apoio para a serra circular fazer o seu trabalho, então eu costumo deitá-lo, mesmo correndo o risco de gorar alguns discos mais novos. Mas nem sei porque costumo me preocupar com isso, pois a segunda etapa é a hora que mais me dá pena, é a hora de abrir os troncos com as cunhas e mareta.

Haaaa amigo, é agora que o bicho pega, cada batida que se dá é um grupo de células de cria novas (abelha em fase de ovo) que vai literalmente se perder, a forte pancada no tronco provoca o goramento dos discos mais novos, mesmo batendo de maneira cuidosa.

A preocupação agora não é nem com o ninho, é com os potes de mel e de polén. Ao iniciar a abertura com as cunhas vamos dando de cara com os potes, a minha dica se você pretende fazer esse manejo um dia é iniciar a abertura sempre por baixo, ou seja, pela área dos potes de mel. Nesse caso você pode ir retirando os que for encontrando de imediato evitando assim ensopar o resto do ninho (discos de cria) com mel.


Vá se preparando para gerar muita sujeira por que logo que se vai abrindo os potes de mel muitos vão se rompendo. A hora é de completa atenção, assim que possível vá levantando o tronco e fazendo com que o mel derrame sempre em direção oposta ao ninho, bem como já se prontifique, utilizando um faca ou mesmo um garfo de mesa, a ir retirando os potes de mel rompidos.

Continuando a abertura do tronco, ao encontrar a área do ninho tome muito cuidado para não descer muito com as cunhas evite bater exatamente onde se encontra o ninho pois se você não tiver cuidado a cunha pode atravessar os frágeis discos de cria, aí amigo o prejuízo é muito grande.




Vejam que na foto acima eu consegui abrir sem provocar quase nenhum dano ao ninho, mas nem sempre é assim pois muitas vezes os discos não ficam ligados só de um lado do tronco, o que provoca uma verdadeira destruição dos discos que ainda tem alimento larval. Nesses casos, o ideal é descartar esses discos e aproveitar somente os que já estão em fase de pupa, ou seja, os mais claros.




Com um faca retiramos os discos e alojamos com cuidado na caixa, durante essa acomodação dos discos se deve usar bolinhas de cera para apoiar os discos no piso da caixa, para que as abelhas possam circular por baixo dos discos, isso também evita que o peso dos discos de cima acabem destruindo os de baixo. Lembre-se que todo cuidado com a caixa é pouco, o ninho está solto e a caixa deve ser tratada com muito cuidado para se evitar grandes impactos. As abelhas só vão colar tudo isso depois de alguns dias.


(clique na foto para ampliar e procurar pela rainha que está se escondendo)


Durante a passagem do ninho, vai se procurando pela rainha, na verdade, vai se procurando por ela durante todo o processo, pois muitas vezes ela pode estar entre os potes de mel não sendo vista de imediato, nesse tronco quase que eu perdi a rainha pois já tinha procurado por ela em todos os pedaços do oco, mas não tinha encontrado, já estava quase desistindo quando avistei de relance escondida entre pedados de cera. Sorte eu ter olhos de águia!!!

Mas se por acaso não encontrarmos ou mesmo se você matá-la sem querer, nem tudo está perdido pois as operárias, se no ninho tiver discos já velhos, vão escolher outra em seu lugar. O ruim é quando não se tem muitos discos, aí se deve retirar algum de outra caixa para ajudar as abelhas. Por isso é que toda essa operação é cheia de riscos e deve ser feita com muito cuidado, pois caso contrário podesse perder todo o enxame.


Localizando a rainha ela deve ser capturada e guardada em algum recipiente e só ser devolvida a colônia depois de todo o fim do processo de transferência.





Na foto acima eu estou deitado para evitar derramar o mel do restante dos potes em cima das abelhas que não sabem voar, todo o trabalho e sacrifício é para evitar matar o máximo de abelhas possível.

Uma ferramenta indispensável é uma cerveja bem gelada pra matar a sede nas horas de maior dor de cabeça, pois nem tudo sai como planejado e muitas vezes você é obrigado a mudar o próximo passo para evitar não ferir as meninas.

Muitas delas ficam tentando se esconder entre os potes e as brechas do tronco e devem ser ao máximo preservadas, vou retirando o mel furando os potes. O mel vai escorrendo e de imediato se deve colocar algum recipiente para se aparar o líquido delicioso que vai derramar.

Esse mel vai está bem sujo de pó de madeira e muitos pedaços de própolis, esse mel não pode ser comercializado por todas as questões sanitárias que envolvem essa trabalhosa operação, mas certamente pode ser decantado e filtrado para ou ser devolvido as abelhas ou ser consumido por nós aqui em poucos dias. Poucos dias mesmo por que aqui em casa, todos querem um colher desse mel, tem gente aqui que mais parece criança fazendo birra pra levar mais do que pode, rssssss..




Os potes que são removidos são furados e escorridos, a cera é lavada e deixada pra secar rapidamente no sol, se demorar muito eles vão derreter durante a exposição, por isso é preciso manter o formato inicial, depois de secos e limpos eles serão devolvidos a colônia. Não se deve colocar potes de mel lambuzados dentro da caixa nos primeiros momentos, pois alguma coisa pode se soltar e derramar ainda mais dentro da caixa, provocando um grande lambuzeira. Fora que o mel derramado dentro pode despertar nas outras caixas a pilhagem, ou que vai gerar brigas e muitas mortes.


Fora os potes de mel temos os potes de pólen, se os mel não pode ser colocado de imediato os polén nem pensar, esses só são colocados de 3 a 4 dias após a colônia já está alojada em sua nova morada, a colocação desses potes de pólen abertos atraem os malditos forídeos, para aqueles que não sabem leiam sobre eles no tópico aí (http://www.meliponariodosertao.com/2009/05/o-inimigo-n-1-da-jandaira.html), o ideal é deixá-los na geladeira para evitar a contaminação e manter a sua conservação.


Por fim, é chegada a hora de utilizar o pulmão, utilizando o sugador de abelhas, instrumento dos mais fáceis de fazer, vai se coletando o restante das abelhas (as que não sabem voar e as que estão lambuzadas de mel) é muito importante fazer isso pois nenhuma abelha pode ser deixada de ser aproveitada, as abelhas sem ferrão, em especial a Jandaíra, são abelhas que são pouco populosas comparadas as abelhas do gênero apis, um ninho de Jandaíra dificilmente ultrapassa as 800 abelhas, bem diferente da africanizada que pode chegar na casa dos 60 a 80 mil abelhas, então cada abelha é importante para colônia pois caso muitas sejam perdidas isso vai provocar uma demora no desenvolvimento ou mesmo na própria recuperação da colônia.



Após, retira-se a casa que estava enganando as abelhas e colocá-se no lugar a casa que se encontra o ninho, nessa hora devolvemos a rainha ao ninho e abrimos o sugador de abelhas virando-o rapidamente dentro da caixa que está o ninho. As abelhas mais uma vez vão sair da caixa enganadora e vão tentar novamente entrar na caixa definitiva que estão os discos de cria e as abelhas que não sabem voar.
Por fim, depois de todo esse trabalho que dura em média quase uma hora o jeito é limpar toda a bagunça, tomar um bom banho e ir beber o restante das cervejas geladas estão no congelador porque eu também sou filho de Deus, rsssss....
att,
Mossoró-RN, em 20 de dezembro de 2010
Kalhil Pereira França
Meliponário do Sertão

10 comentários:

  1. Olá Kalhil, tudo bom? Olha, nunca "situei" uma colônia a partir do tronco, apenas uma jati alojada em um muro, mas já descofiava que a "operação" não seria fácil, não apenas pela mão-de-obra indispensável, mas pelo cuidado em todas as etapas, como vc descreveu.
    No mais ficam dois comentários que achei interessantes e que aqui já conhecíamos, pois a utilização de uma caixa rcional a fim de ficar recebendo as campeiras enquanto se está fazendo a "operação" é um fator imprescindível. tanto é que ao observarmos que elas relutavam em aceitar uma caixa vazia, passamos a utilizar seja na transferência, seja na divisão de uma colônia uma caixa que ainda guardava própolis e resquícios de uma antiga colônia que não "vingou". E desde então elas entravam com facilidade nesta caixa temporária enquanto "trabalhávamos" na caixa-mãe. Um abraço amigo. Fco. Mello

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  2. Adorei o detalhe da cerveja! hehehe Muito importante :)

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  3. olá tenho uma pergunta nas caixas INPA de quatro conpartimentos as crias(ovos) ficam na parte de cima ou na perte de baixo na entrada (furo de passagem das abelhas) os potes de mel ficam em qual canto.

    obrigado pela atenção.

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  4. Olá Francisco, dá trabalho amigo, muito trabalho, o detalhe da caixa enganadora é essencial pois sem ela as abelhas vão procurar outra caixa pra entrar o que gera brigas.

    Patrícia, quanto a cerveja é item demais especial, não dá pra trabalhar no sertão sem um energético, rssss....

    Anônimo, quanto a sua dúvida o ideal é deixar os discos de cria do jeito que você encontrou no pau, na foto eu fiz o inverso mas é que eu parei a operação para tirar uma foto.

    Kalhil

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  5. Olá Kalhil, tudo bem!

    Parabéns pela matéria, interessante a caixa que você coloca para enganar as abelhas,gostei dessa ideia, eu ainda não fiz transferência no meliponário, só fiz na própria "caatinga" (mata), devido o enxame está numa árvore (imburana) localizado no caule e ser inviável para o transporte.

    Kalhil, para fazer uma transferência do ninho de uma ASF do "oco" de uma árvore para uma caixa racional. Sendo que o galho da árvore que se encontra o "ninho" está numa posição vertical ou numa inclinação de 45º. E para melhor manejo desejo trazer o troco da árvore para fazer a tranferência no meliponário. Preocupado em não alterar a posição dos discos de cria. Pergunto lhe: Caso não cabe na mala do carro na posição vertical (a que se encontrava na mata), posso colocar na posição horizontal.

    Um abraço!
    Antonio Coelho
    Petrolina-PE

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  6. Olá Antônio, pode trazer deitado e se possível eu aconselho a manter quando for colocar o tronco no meliponário na posição que você encontrou no Mato, se não for possível vc até pode deixar deitado. elas vão recomeçar os discos na posição que você deixar, o que não se pode fazer de maneira nenhuma é virar o tronco de cabeça para baixo, isso faz gorar os discos mais novos na hora pois o alimento larval da célula de cria vai afogar os ovos.
    E outra coisa, assim que colocar no lugar não faça esse manejo de transferência no outro dia, espere pelo menos uma semana ou mais para que as abelhas possam aprender a localização do novo local do tronco.

    Kalhil

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  7. A caixa encostada na parede não atrai formigas? Lagartixa?

    Parabéns pela matéria, ficou muito ilustrativa.

    Valia até um videozinho!! hehehehehe

    abraços

    Jonas

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  8. Amigo Kalhil

    Desejo um FELIZ NATAL e BOM ANO de 2011, são os votos do "Montedomel"

    Abraços
    Joaquim Pifano

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  9. Muito boa a descrição do procedimento. Só fiquei sentindo falta de uma advertência importante: NÃO SE DEVE TIRAR COLMEIAS DE SEU HABITAT NATURAL A NÃO SER QUANDO O TRONCO ESTIVER AMEAÇADO. Por exemplo, para defender as abelhas em áreas em desmatamento. Em lugares protegidos elas deveriam ser mantidas em seu lugar. E junto dali se podem construir caixas-isca muito simples para MULTIPLICAR, não SUBTRAIR. Como amante de melíponas que vc certamente é, deverá concordar com a importância de ressaltar essa idéia na sua matéria. E de colocar a questão nos comentários, onde algumas pessoas vêm tirar dúvidas sem saber qeu existem leis que defendem a localização natural das colmeias, o que não quer dizer que não se deva mais e mais difundir a idéia de caixas racionais e outras formas de enxameação doméstica.
    Abraços, Ricardo Valle
    Vitória da Conquista - BA

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