sábado, 29 de janeiro de 2011

Areias Alvas, tradição em meliponicultura

Nessas minhas andanças pelo litoral norte de Tibau/Grossos/Areia Branca fui mais uma vez visitar uma comunidade que sempre encontro pequenos, mas antigos meliponicultores.

Ainda temos nessa região uma cultura muito forte que é a criação rústica e sem compromisso das abelhas sem ferrão, em quase toda casa tem um pequeno cortiço de Jandaíras.

Nosso destino é a comunidade de "Areias Alvas", pertencente ao Município de Grossos-RN, essa comunidade tem esse nome pela singularidade do terreno, extremamente claro e salino.


Uma curiosidade da região é a existência na comunidade do 2º maior cajueiro do mundo, como mostra a foto abaixo a planta tem proporções fora do padrão.

(fonte: internet)

Nessa missão sou acompanhado, melhor dizendo, sou escoltado de forma implacável por essas duas figurinhas aí abaixo. A primeira, com seu sorriso fácil e faltando alguma coisa, é a Maria Eduarda, minha filha que passa férias comigo aqui no RN. O segundo, de cara marrenta e perguntador, é o Alfredo, sobrinho da minha esposa, na verdade é mais meu sobrinho do que dela, rsss.

Já no caminho a Maria Eduarda vai me chamando atenção pela bela florada da região, mesmo não sendo uma região puramente de caatinga, tem em sua configuração um pouco de tudo, principalmente carambolas nativas que são muito visitadas pelas abelhas.

A florada do momento é o velame, essa planta tem uma floração intensa. Mesmo distante podemos observar o mato quase que dominado pela brancura desse belo arbusto. Pela manhã é quase impossível disputar espaço com as apis que constantemente visitam a planta.


A primeira parada é na casa do seu Francisco, na verdade, na casa do seu "Mago" como ele gosta de ser chamado. Sempre que posso venho visitá-lo para acompanhar esses dois cortiços que ele tem há mais de 18 anos, nunca fez um manejo sequer. No máximo retira algum mel durante as épocas de fartura.

Na foto abaixo ele me mostra o peso dos cortiços afirmando que estão com muito mel. Confirmando as minhas desconfianças pergunto ao seu Mago sobre a existência de duas espécies de Jandaíra, sem demora seu Mago me diz que existem duas Jandaíras, uma menor, mais populosa e agressiva, bem como muito produtiva, que ele chama de Jandaíra de litoral. A outra, maior, mais dócil, de menor produtividade do interior.

É imprecionante como a cultura popular pode surpreender a científica, somente agora as suspeitas da existência dessas duas sub-espécies estão em evidências, mas já há muitos anos o sertanejo tem essa certeza quase que absoluta.

Bem, o futuro nos guarda muitas surpresas, em breve veremos se esse "mito" popular se concretiza.

Enquanto tirava a foto dos cortiços do seu Mago, minhas companhias, literalmente, me cutucavam tentando me mostrar algo que, segundo eles, era os mais novos amiguinhos do pedaço.

Na verdade, era apenas uma família de macaquinhos da espécie conhecida como "sagüis" que habitam as proximidades e são alimentados com frutas pelo Seu Mago. Quase que não consigo mais ir embora com esses meninos querendo levar os bichos para casa.

Depois de convencer a dupla que o lugar dos bichos era na casa do seu Mago, fomos em direção a casa de outro pequeno meliponicultor, Seu Raimundo. Mesmo não estando em casa um dos seus sobrinhos me acompanhou e me deixou coletar algumas amostras e tirar fotos do humilde e pequeno meliponário.

Esses cortiços estão abandonados aí faz anos, o pessoal cria as abelhas apenas para extrair o mel durante o inverno mas não desenvolve qualquer tipo de manejo no intuito de ajudar as colônias.

É só venha nós, nada de vosso reino, pobre desses insetos.

O interessante é que o azar de alguns gera a sorte de outros, o fato de não terem cuidados proporciona a morte de muitos enxames pela fome, gerando assim novas casas vazias para outras abelhas, a exemplo nesse mesmo meliponário um enxame de abelhas mosquitos (jatí) se aproveitou do abandono e habitou o antigo cortiço de Jandaíras.


Coletei mais abelhas e segui viagem a caminho do meliponário do Seu Assis, no caminho o Alfredo vai apontando e me dizendo: -Caiu, alí tem abeia!!!! Não me aguentando de rir páro o carro e disparo a máquina para as palmas da dupla nesse lindo pé de amor agarradinho.

Eram tantas abelhas e borboletas que nem deixei os meninos descerem do carro para olharem de perto pois tinha certeza que um deles iria mexer com os insetos e como a grande maioria é apis, já viu né, ia sair gente chorando, rssss.

Ao chegar na casa do Assis vejo o Alfredo observando atentamente esse velho cortiço de Jandaíra.

-Cadê as abeias titio????
- Tão aí dentro, quer vê???
-Quero!!!

Bati na caixa só pra irritar as Jandaíras, não demorou muito pra eu ver o pequeno correndo com as abelhas enrrolando no cabelo dele, rssss... Acho que nunca mais ele vai querer vê as abelhas, maldade minha viu, rsss.

Que nada, passado o susto inicial já estava ele me mostrando outra caixa cobertoa apenas por pequeno telhado. Observem que em todos os meliponários as caixas são as mais simples possíveis. Não é que eles não tenham condições de ter caixas melhores, mas é que o costume foi sempre esse, em manter as abelhas em cortiços muito simples.

A rusticidade é marca registrada nessas comunidades, a própria vedação é feita com barro que não é muito higiênico, mas é bastante eficiente, pois impede a entrada dos forídeos após a coleta do mel.


Partimos viagem em direção a casa de uma amigo e antigo meleiro, sua principal atividade é a fabricação de cercas, por isso ele é conhecido como "Antônio das cercas", no interior é assim, ninguém quase nunca tem só um único nome, geralmente o apelido virá quase o próprio nome.

Nas horas vagas o Antônio é meleiro, sua principal extração é a coleta de mel das africanizadas.

Pense num cabra macho!!! Ele tira o mel dessas abelhas sem nenhuma roupa de proteção, apenas com ajuda de um pequeno fogo e muita coragem. Pergunto pelas ferroadas e ele me diz que não doi.
NÃO DOI!!!! Hora não doi né, só se a pele dele for de sapo, rsss.

Mas também já tirou muita Jandaíra, no passado me confessou abrir uma Imburara e coletar todo mel, deixando somente as capas de crias e campeiras sem nenhuma proteção. Ou seja, cada coleta desse era uma ninho de Jandaíra que se perdia.

Atualmente, o amigo tem feito diferente, informei a ele que era mais vantajoso ele coletar os ninhos manter uma criação, mesmo rústica, em sua casa para assim ter sempre mel disponível. Hoje, no lugar de um meleiro temos mais um meliponicultor.

Abaixo temos um dos seus cortiços pendurados na varanda de sua casa, ainda falta muita coisa a se aprender pois aí essas abelhas são fonte fácil de ataque para largatixas e outros predadores. Mas como é difícil ensinar novos conceitos a alguém que já tem enraizado velhos costumes.


Abaixo está o Antônio da cerca com mais duas Jandaíras ainda no pau da Imburana, estamos combinando em passar essas duas Jandaíras para caixas racionais que em breve irei trazer. Espero que ele possa aprender alguma coisa comigo, pois eu acada dia aprendo mais com essa gente.

att,

Tibau, em 29 de janeiro de 2011.

Kalhil Pereira França
Meliponário do Sertão

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Visita a um belo Meliponário

Mesmo de férias não largo as abelhas, ou seria as abelhas que não largam de mim??? rsrsss

Na verdade, eu gosto muito desses insetos e sempre que posso saiu rodando em busca deles, nessa tarde eu não pude deixar a curiosidade de lado e fui conhecer mais um meliponicultor.

Saímos de Tibau-RN e fomos rapidamente em direção à Grossos, cidade a pouco mais de 16km. Nossa intenção era pegar a balsa que sai de Grossos com destino à Areia Branca, as duas são dividas apenas pelo largo rio Mossoró, acontece que mesmo tão próximas uma da outra a única maneira de se chegar ao outro lado do rio é através das balsas.

saída da balsa ia demorar um pouco ficamos tomando um cervejinha fazendo hora. Enquanto apreciava a cerveja gelada me deparo com belo pé de Tamarinda, caprichosamente todo florido.



Não deu outra, fui chegando mais perto e logo fui observando as mamangavas e outros pequenos insetos entre as flores. Ao olhar mais atentamente me deparo com um enxame de vespas da espécie chamada vulgarmente de "boca torta". Eu não sei o que é isso mas sempre encontro ninhos de abelhas e vespas com facilidade, acho que em vidas passadas eu era algum meleiro.



Pegamos a balsa e partimos de Grossos em direção a cidade de Areia Branca, essas duas cidade são as maiores produtoras de sal do Brasil, aliás do RN sai praticamente 90% do sal consumido em todo Brasil, boa parte da produção é até exportada para vários países.


É constante o movimento de balsa entre as cidades, no caminho vamos cruzando com algumas bem como observando os imensos depósitos de sal que são a todo momento carregados em caminhões em direção ao Porto Ilha.


Não demoramos muito e saímos do centro de Areia Branca a caminha da praia de Baixa Grande, nosso destino era a comunidade Morro Pintado. Vamos costeando as praias e apreciando a bela paisagem litorânea dessa região, ao longe se vê a linda região de Ponta do Mel onde já foi gravada várias novelas e mini-séries da rede Globo de televisão.


Vamos entrando em um assentamento próximo ao destino e minha visão apurada é surpreendida pela observação de vários cortiços coloridos. Meu cunhado logo fala: -Puts, aquilo pra mim são Jandaíras!!!!!!


Rapaz, estavamos indo em direção errada!!!!!!

A nossa sorte foi ter avistado as caixas de relance. Mais uma vez meu olhos de águia nos salvaram. Descemos e batemos palmas, logo sou recebido por um Senhor muito simpático e receptivo.


-Boa tarde amigo, estou procurando pelo Sr. Mesquita!!!

- É ele mesmo!!!

Pronto, daí em diante passamos uma tarde quase toda conservando. O Sr. Mesquita é aposentado pela Companhia de Docas do RN e a 12 anos vem morando naquela comunidade, começou a criar as abelhas sem ferrão na mesma época e de lá para cá vem com muito carinho mantendo 45 enxames de Jandaíras no maior capricho.

Passeamos pela sua Chácara conhecendo cada recanto, até mesmo os belos e muito bem organizados galinheiros de raça. Tudo na verdade é muito bem organizado e limpo, nem sei como ele consegue manter tanta organização assim.

Por lá não falta água graças aos poços artesianos e ao grande número de bomba de água que espalham a água por toda propriedade, só cisternas ele nos mostrou 3, cada uma com capacidade para 3 carros pipas. O homem prevenido!!!!


No local há lindos pés das mais variadas frutas, até pé de tangerina eu encontrei, rsss.

Vejam como é lindo e organizado o meliponário, confesso nunca ter observado um meliponário tão bonito assim. Cada enxame vizinho tem uma cor diferente do seguinte exatamente com tem que ser feito, tudo para facilitar o reconhecimento da caixa pelas campeiras que chegam do mato.


Um detalhe curioso é a utilização de paliteiros como iscas para forídeos constantes, não sei se isso é um vantagem pois a constante exposição do cheiro do vinagre pode atrair ainda mais as malditas mosquinhas para próximo a entrada das colônias.


Tudo é feito e pintado pelo Seu Mesquita, é essa bancada que ele trabalha fazendo suas caixas de Imburana para as Jandaíras, um questão levantada por mim foi madeira utilizada para confecção das caixa, existe um mito que só a Imburana seria boa para a criação da Jandaíra, mas qualquer madeira seca de boa qualidade é ideal para caixas, eu mesmo uso muito louco canela ou cedrinho, madeiras mais fáceis e mais baratas para encontrar. Imburana é nativa e como diz o matuto, "é pau de abeia, vale mais em pé do que deitada".


Conversando o nosso amigo ele me confessou que chega a colher em épocas de bom inverno até 2,5 litros de mel por cortiço, eu fiquei fascinado com isso pois é uma produção muito, mas muito boa por cada caixa. Fiquei surpreso pois as minhas raramente cruzam a casa de um litro.

Talvez seja uma questão evolutiva, já algum tempo estamos observando e acreditando que possa existir mais de uma espécie de Jandaíra, talvez uma do litoral, maior e mais produtiva, comparada com a caatinga do interior, menor e menos coletora.

Não sei, somente as pesquisas da Dra. Vera Lúcia Imperatriz (USP-UFERSA) vão nos confirmar, eu tenho uma hipótese, talvez a proximidade com mangue da região proporcione as abelhas uma maior florada, mesmo em épocas de baixa produção.

Enfim, sai de lá encantado e com a certeza que vou voltar, penso em levar a caixa Modelo INPA para conhecimento do Mesquita, bem como uma caixa de Uruçu, abelha essa que despertou a curiosidade do amigo por não conhecê-la, quem sabe numa próxima ocasião possa levar para ele.

att,

Tibau-RN, em 26 de janeiro de 2011.

Kalhil Pereira França
Meliponário do Sertão

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Abelha ordenhadora???


Ontem recebi a foto de um colega Meliponicultor de São Paulo-SP, tratá-se do José Roberto que nos mandou uma imagem muito interessante onde nos mostra uma abelha num muda de Astrapéia

Parece ser uma trigona ou scaptotrigona sp, eu acho que se trata de uma abelha Irapuá (trigona spinipes), que aparentemente está ordenando esses insetos.

Não sei que inseto é esse, talvez alguma espécie de pulgão. Pela foto não dá pra ter certeza se ela está coletando dos insetos ou do broto da planta. de toda forma é uma bela foto que merece ser publicada. Então, segue para conhecimento geral.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Novas matrizes a caminho...


Faz tempo que estou sumido né! Na verdade estou de férias e não tenho tido muito tempo para o blog, mas antes de viajar a Tibau-RN para passar alguns dias na praia junto com a família, realizei algumas divisões na semana passada.

Com o decorrer das chuvas desses últimos dias tive que retornar a Mossoró-RN para inspecionar as colônias que tinham sido dividas. Acontece que a chuva forte tem molhado alguns cortiços que estão exposto ao sol e vim para inspecioná-los, bem como alimentá-los.

Enxames novos não tem a capacidade plena de produção e precisam da ajuda do meliponicultor no início da formação, daí a inspeção se torna necessário, principalmente em épocas de chuvas.

Eu fiz 12 divisões, mas só tive tempo para inspecionar 6, ao iniciar abertura fiquei feliz pois não encontrei forídeos, não vi abelhas mortas (sinal de luta) e em todas vi a formação do inicial do túnel de entrada, a primeira defesa das abelhas.

Fui abrindo as caixas e vendo o início da postura, sinal que já temos uma eleita, principalmente quando a postura é tão regular como a de cima. Essa caixa por sinal é a que tem a maior quantidade de campeiras adultas, só eu sei o trabalho que dá pra tirar essas fotos com caixas assim pois nessa fase as abelhas estão muito agressivas e se irritando com facilidade.

Nessa outra as coisas também vão muito bem, mesmo sem sinal de postura inicial podemos observar um bom desenvolvimento, há uma boa quantidade de potes de alimento em tão pouco tempo.
Nessa caixa a quatidade campeiras era bem menor, acho que a maioria das campeiras foi absorvida por uma caixa vizinha que também foi divida. Talvez esse enxame demore mais pra se desenvolver, mesmo assim tudo vai bem, já há até potes lacrado de polén.


Na seguinte podemos observar a ótima qualidade das campeiras que foram doadas, são muitas, muito acima do normal até mesmo para um enxame grande. Imaginem a quantidade e qualidade dos discos da caixa matriz, na verdade não é uma caixa, essa divisão veio de um tronco muito bonito que em breve será situado. Um coisa muito interessante é que a Jandaíra não faz envólucro nos discos de cria, mas o "frio" dos últimos dias fez as abelhas desenvolverem uma significativa camada isolante, sinal que essas abelhas tem boa capacidade adaptativa. Não é a toa que tem Jandaíra sendo criadas até no Rio Grande do Sul, que me diga o meu amigo Oderno lá de Lajeado que mais de ano vem mantendo a matrizes que lhe mandei.


Em todas as caixas podemos perceber um ótimo desenvolvimento, nem foi preciso usar iscas para forídeos, aliáis, isso é algo que nos últimos tempos não tenho tido problemas, raramente tenho vistos por aqui.

Na última caixa podemos verificar o início de uma ótima postura, não vi a rainha pois não quis me demorar na abertura das caixas, mas tenho certeza que ela já está por ali, por fim é só manter os cuidados e alimentação rica em proteína que em pouco menos de 6 meses todas elas ficarão assim, iguais a essa colônia abaixo, uma de nossas melhores matrizes.

att,

Mossoró-RN, em 24 de janeiro de 2011.

Kalhil Pereira França

Meliponário do Sertão